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Patrimônio de afetação na recuperação judicial e na falência

O presente artigo se propõe a analisar o instituto do patrimônio da afetação, sob a ótica do Direito Falimentar e Recuperacional. Será abordado o conceito do instituto e do seu tratamento pela legislação nacional, além dos pontos controvertidos sobre o tema. Far-se-á, ao final, uma análise específica sobre o patrimônio da afetação na falência e se apontará a necessidade de previsão legal do instituo em sede de recuperação judicial.

  1. INTRODUÇÃO
    O presente trabalho versa sobre patrimônio de afetação e, especificamente, sobre o tratamento deste instituto no direito da insolvência, notadamente nos processos de recuperação judicial e de falência.

O principal objetivo do estudo é analisar as consequências aos credores e ao próprio patrimônio afetado quando da insolvência do respectivo titular, nos termos da legislação e da interpretação dada pela jurisprudência pátria.

Para tal intento, foram utilizados dois métodos de averiguação de resultados: revisão da literatura pertinente e análise de casos concretos.

Ao final, o estudo abordará aquela que é atualmente a principal controvérsia sobre o tema: a aplicação ou não do art. 119, IX, da Lei de Recuperação e Falência (LRF) às hipóteses de recuperação judicial.

  1. CONCEITO, CARACTERÍSTICAS E DISCIPLINA LEGAL DO PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO
    O conceito de patrimônio, por sua relevância, é objeto de estudo há muito tempo no Direito Brasileiro. Segundo Pontes de Miranda, “No Código Civil e no Código Comercial, patrimônio é o ativo, que, se há passivo, é atingível por esse”[1].

Já para Silvio Rodrigues[2], “o patrimônio é formado pelo conjunto de relações ativas e passivas, e esse vínculo entre os direitos e as obrigações do titular, constituído por força de lei, infunde ao patrimônio o caráter de universalidade de direito (cf. Sylvio M. Marcondes Machado, Limitação de Responsabilidade do Comerciante Individual, n. 79)”.

Exatamente nesse sentido, vale frisar que o art. 91 do Código Civil Brasileiro estabelece que “Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico”.

Patrimônio de afetação, por sua vez, é definido por Melhim Namem Chalhub como sendo “uma universalidade de direitos e obrigações destinada ao cumprimento de determinada função e integrado ao patrimônio geral [do titular]”[3].

Os atualizadores da obra de Pontes de Miranda trataram patrimônio de afetação como “uma forma de securitização dos créditos que se destinam à atividade de incorporação imobiliária”. E prosseguem destacando que “Por esse regime, ‘o terreno e as acessões objeto de incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do incorporador e consistirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da incorporação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes’ (art. 30-A da Lei 4.591/1964 – Lei de Condomínios e Incorporações)”.

Ainda segundo os atualizadores da obra de Pontes, “Sua principal utilidade é distinguir esferas patrimoniais, dado que não se comunica com o acervo geral do incorporador, com outros patrimônios de afetação e, de modo notável, ele responde por dívidas e obrigações vinculadas à incorporação respectiva. Como bem salienta a doutrina, ‘a afetação visa a garantir que as receitas de cada incorporação sejam rigorosamente aplicadas na realização do respectivo empreendimento, impedindo o desvio de recursos de um empreendimento para o outro ou para as obrigações gerais da empresa incorporadora, que sejam estranhas às obrigações vinculadas ao empreendimento afetado. Por esse modo, a afetação atende a necessidade de conferir tutela especial a todos quanto contribuíram para a realização da obra, sejam aqueles que tenham contribuído para erigir o edifício com seu esforço pessoal – os trabalhadores – ou aqueles que a financiaram com seus recursos – os adquirentes e as entidades financiadoras – e, ainda, os credores preferenciais por créditos previdenciários e fiscais vinculados ao negócio (Chalhub, Melhim Namem. A incorporação imobiliária como patrimônio de afetação – A teoria da afetação e sua aplicação às incorporações imobiliárias. Comentários à MedProv. 2.221, de 04.09.2001. Revista de Direito Imobiliário. Vol. 55, p. 62. São Paulo: Ed RT, jul. 2003)”[4].

De forma resumida, portanto, patrimônio de afetação é uma universalidade de direito, destacada do patrimônio geral do respectivo titular, mas dele fazendo parte, vinculada a uma destinação específica.

O Direito brasileiro admite a afetação do patrimônio de determinada pessoa, natural ou jurídica, em algumas hipóteses. Para fins deste estudo, importa aquela referente às incorporações imobiliárias[5].

Vale lembrar que atividade incorporadora é aquela por meio da qual o dono do terreno, o promissário comprador, o cessionário de direitos ou o detentor da posse, vende antecipadamente unidades imobiliárias em edifício a ser construído ou em construção, captando, assim, recursos com vistas a financiar o próprio empreendimento.

Segundo Caio Mario da Silva Pereira[6], que vem a ser o autor do projeto que se converteu na Lei 4.591/1964, a incorporação apresenta os seguintes caracteres: (a) é uma espécie contratual típica, bilateral e sinalagmática, o que importa na sua submissão aos princípios contratuais inerentes (exceção do contrato não cumprido, cláusula resolutiva tácita, resolução) – e, para os atualizadores, a resolução por onerosidade excessiva por alteração das circunstâncias, desde que por fato imprevisível (arts. 478 a 480 do CC/2002); (b) é um contrato oneroso de execução sucessiva”[7].

Cuidará a incorporadora da gestão de seus empreendimentos, do adimplemento das mais diversas obrigações, da engenharia financeira a fim de concretizar a construção, do bom relacionamento e prestação de contas aos adquirentes de unidades autônomas, entre outras funções afins. Em outras palavras, o incorporador é o responsável por gerir o(s) empreendimento(s).

E o mesmo incorporador pode ter diversos negócios acontecendo ao mesmo tempo. Para que os compradores de unidades autônomas e demais players de uma incorporação específica não fiquem sujeitos aos riscos de outra incorporação, criou-se, na incorporação imobiliária, a figura do patrimônio de afetação.

Assim, a incorporadora destaca parte de seu acervo patrimonial para dar a esta parte destinação específica, de empreendimento determinado. Ficam segregados, por exemplo, terreno e respectivas acessões, as receitas vinculadas, bem como as respectivas obrigações, sejam elas propter rem, tributárias, trabalhistas ou outras, sempre, claro, vinculadas a esta parte que foi afetada pela incorporadora.

Esse conjunto de bens, direitos e obrigações passa a ter destinação específica e a esta destinação fica vinculado, passando a ser visto de forma apartada do patrimônio geral (mas ainda dele fazendo parte).

Em outras palavras, o patrimônio afetado passa a ter autonomia negocial e gerencial. Responderá por seus encargos e auferirá as receitas relacionadas. Passa a se auto sustentar.

A ideia principal do patrimônio de afetação nas incorporações imobiliárias é trazer segurança aos adquirentes de unidades autônimas, reservando certos bens e toda a correspondente operação àquela destinação exclusiva.

Vale aqui abrir espaço para frisar que patrimônio de afetação não se confunde com outros possíveis caminhos de estruturação imobiliária, notadamente as SPEs (Sociedades de Propósito Específico).

Com efeito, as SPEs são sociedades constituídas para a realização de um ou mais negócios determinados[8]. Como se depreende das definições apontadas acima, não são patrimônio. São sociedades. E se não são patrimônio, menos ainda serão patrimônio de afetação.

Quando uma SPE é constituída por outra sociedade, esta retira de seu ativo os bens por meio dos quais capitaliza a SPE e recebe, em troca, a respectiva participação societária (quotas ou ações).

Pode acontecer, claro, de a própria SPE afetar seu patrimônio, mas esse é outro problema. Ao contrário do que ocorre nas SPEs, no patrimônio de afetação não há constituição de nova personalidade jurídica, nem troca de posições ativas e passivas do patrimônio original. Como dito, mesmo segregado, afetado, aquele patrimônio continua integrando o patrimônio de quem o afetou.

Uma das consequências de todo o mencionado acima é a mitigação do princípio da livre disposição da propriedade. Em outras palavras, estando parte do patrimônio afetado, é correto afirmar que seu detentor só poderá desta parte dispor nos limites legais e de acordo com os ditames estatutários e contratuais estabelecidos na afetação.

E aqui também se faz oportuno lembrar que nem todo patrimônio afetado é um patrimônio de afetação. E o exemplo da fundação ilustra bem isso. A fundação é um patrimônio afetado, mas não é um patrimônio de afetação. Com efeito, constituída a fundação, ela se destaca do patrimônio de quem a constituiu, passando a ser dotada de personalidade jurídica própria, nos termos dos artigos 62 e seguintes do Código Civil Brasileiro. O patrimônio de afetação strictu senso, como vimos, tem outras características.

E, por falar em características, eis algumas das mais importantes no que tange a patrimônio de afetação:

Ele só pode existir se for autorizado por Lei. Ou seja, ao contrário da regra geral de direito privado que autoriza tudo o que não for expressamente vedado, o patrimônio de afetação, para existir, deve ser expressamente autorizado por Lei. Isso se dá em virtude de o patrimônio de afetação ser exceção à regra de que todo o patrimônio do devedor responde por todas as suas dívidas;
É constituído a critério exclusivo do detentor do patrimônio. A despeito de fundadas críticas[9], notadamente no que tange às incorporações imobiliárias (que teriam função social relevante e influência na economia popular a justificar uma decisão conjunta ou mesmo a afetação obrigatória), fato é que a decisão de afetar ou não o patrimônio cabe exclusivamente a seu titular;
Uma vez constituído, esse patrimônio passa a ser incomunicável. De fato, essa é a principal característica do patrimônio de afetação e essa é sua ratio essendi – ser incomunicável – o que significa que está vinculado aos direitos e obrigações relacionados, não sendo atingido, nem atingindo, pelo restante do patrimônio de quem o afetou[10];
Para ser oponível a terceiros, o patrimônio de afetação deve ser registrado. Deve, pois, ter publicidade. Na incorporação imobiliária, tal publicidade se dá através do arquivamento do Memorial de Incorporação que contém a afetação, no registro imobiliário competente;
O patrimônio de afetação deve ter contabilidade separada. Com efeito, referida universalidade, ante sua especificidade, deve receber tratamento contábil separado. Tal disposição, no entanto, tem apenas efeitos de ordem prática e operacional, pois o patrimônio de afetação, como vimos, não é destacado do patrimônio restante de seu detentor;
O patrimônio de afetação extingue-se ordinariamente pela consecução de sua finalidade[11]. Pode haver, no entanto, extinção extraordinária por deliberação neste sentido. A extinção implica em desafetação do patrimônio, inclusive de créditos e dívidas vincendas.
A Lei que trata do patrimônio de afetação nas incorporações imobiliárias é a 4.591/64[12], com redação, no que importa ao tema, dada pela Lei 10.931/2004.

Operação muito comum no universo das incorporações é a cessão de direitos creditórios, pela incorporadora, a instituição financeira. Nestes casos, o produto desta cessão também passa a integrar o patrimônio de afetação até o respectivo limite, conforme esclarecem os §§ 4º e 6º do art. 31-A da Lei 4.591/64.

Ainda nesta linha (de o incorporador vender seus recebíveis), a entidade securitizadora que comprar os recebíveis poderá emitir certificados e os colocar à disposição do mercado. São os chamados certificados de recebíveis imobiliários (CRI) que, se forem colocados no mercado sob o regime fiduciário, segundo defende Fabio Ulhoa, constituirão também patrimônio afetado, nos termos dos arts. 10, II, e 11, da Lei 9.514/97[13].

Algumas considerações de ordem contábil também se fazem importantes para a exata compreensão do instituto. Como dito, o patrimônio de afetação deve ter orçamento e contabilidade próprios, separados da contabilidade geral do restante do patrimônio, mas também geridos pelo incorporador. Pode disto resultar um CNPJ autônomo.

A Lei 10.931 prevê a possibilidade de adoção de um regime tributário especial para o patrimônio de afetação, cuja aderência é facultativa.

O patrimônio de afetação é fiscalizado por uma Comissão de Representantes. Esta Comissão exerce papel importante e pode até mesmo destituir a incorporadora da gestão do patrimônio de afetação se as coisas não estiverem fluindo bem.

Atingida sua finalidade, encerra-se a afetação, assim como se encerra quando da impossibilidade material de sua realização ou por deliberação extraordinária neste sentido.

Concluindo este tópico, vale dizer que também no Direito comparado encontra-se a figura do patrimônio de afetação, mencionando-se, por todas, a Lei Argentina nº 20.509.

  1. O PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO NA FALÊNCIA
    Feitas as considerações conceituais, indispensáveis para assentar as bases deste estudo, passa-se propriamente ao objeto do tema, que é o patrimônio de afetação inserido no universo da insolvência. Em outras palavras, o patrimônio de afetação na recuperação de empresa e na falência.

Não há dúvida, pelo que já pudemos observar, que o patrimônio de afetação tem como principal objetivo trazer segurança aos adquirentes das unidades imobiliárias, às instituições financiadoras e ao sistema habitacional como um todo. Na mesma linha, pode-se dizer que o instituto implica em um diferencial em termos de segurança, que pode ser refletido no preço de venda da unidade autônoma.

Com efeito, se determinada incorporadora tem a falência decretada e não houver patrimônio de afetação no caso concreto, todos os seus bens serão arrecadados à massa e os respectivos adquirentes das unidades imobiliárias terão que se habilitar no concurso universal. E, como detentores de privilégio real, estes adquirentes estarão atrás, na ordem de preferência falimentar, de outros importantes credores, como o fisco e os credores trabalhistas, reduzindo bastante, pois, as chances de receberem algo.

Risco idêntico, como ensina Melhim[14], corre o financiador da incorporação. Por outro lado, se aqueles credores adquiriram unidades imobiliárias de um patrimônio afetado, submeter-se-ão a situação bem mais favorável em caso de insolvência do incorporador, reduzindo significativamente a exposição aos efeitos da falência, como veremos a seguir.

Importante ter em mente que a criação do instituto afetação, em 2004 (Lei 10.931, de 2004) e a própria Lei de Recuperação Judicial e Falência, de 2005 (Lei 11.101, de 2005), no particular, estão bastante relacionadas com ‘o caso Encol’.

A Encol, na segunda metade do século XX, era uma das maiores construtoras e incorporadoras do Brasil, quiçá a maior. Chegou a ter mais de 20.000 (vinte mil) funcionários e faturava bilhões (em números atualizados). Quando faliu, em 1999, mais de 40.000 (quarenta mil) compradores de unidades autônomas foram prejudicados.

O legislador brasileiro, então, tomou providências para tentar evitar que danos dessa grandeza voltassem a se repetir. Assim, em 2004 foi promulgada a Lei 10.931 que, alterando a Lei que trata de condomínios em edificações e sobre incorporações imobiliárias (Lei 4.591, de 1964), instituiu o regime de patrimônio de afetação. E, no ano seguinte, foi promulgada a Lei de Falência e Recuperação de Empresas (Lei 11.101/2005).

No que diz respeito ao tema em foco, a Lei 11.101/2005 ao tratar dos efeitos da decretação da falência sobre as obrigações do devedor (Capítulo V, Seção VIII), dispõe que:

Art. 119. Nas relações contratuais a seguir mencionadas prevalecerão as seguintes regras:

(omissis)

IX – os patrimônios de afetação, constituídos para cumprimento de destinação específica, obedecerão ao disposto na legislação respectiva, permanecendo seus bens, direitos e obrigações separados dos do falido até o advento do respectivo termo ou até o cumprimento de sua finalidade, ocasião em que o administrador judicial arrecadará o saldo a favor da massa falida ou inscreverá na classe própria o crédito que contra ela remanescer.

Ou seja, a Lei posterior expressamente manteve o quanto disposto em Lei anterior, especial neste particular, quanto ao patrimônio de afetação. Além disso, deixou claro que o patrimônio afetado permanece separado do patrimônio do falido até a extinção da afetação (termo ou cumprimento de sua finalidade).

Se o saldo do empreendimento afetado for credor, este saldo será arrecadado à massa. Por isso, a massa falida, como eventual credora do patrimônio de afetação, tem interesse em acompanhar todos os procederes da Comissão de Representantes, que passa a gerir o empreendimento específico.

Se, por outro lado, o saldo final for devedor, os credores inscreverão seus créditos (o saldo) na classe própria no procedimento concursal.

Diante da expressa determinação da Lei Falimentar, então, a insolvência da incorporadora será tratada conforme a Lei especial que, neste caso, é a Lei 4.591, alterada pela Lei 10.931 [15].

O art. 31-F da Lei 4.591 determina que “os efeitos da decretação da falência ou da insolvência civil do incorporador não atingem os patrimônios de afetação constituídos, não integrando a massa concursal o terreno, as acessões e demais bens, direitos creditórios, obrigações e encargos objeto da incorporação”.

Decretada a falência, a Comissão de Representantes (já existente ou instituída em virtude da quebra) convoca assembleia geral dos adquirentes para deliberação sobre a continuidade da obra e em que condições, ou a liquidação do patrimônio de afetação.

A Comissão de Representantes passa a ter amplos poderes na gestão do patrimônio afetado. Exemplo disso é que poderá firmar com os adquirentes das unidades autônomas o contrato definitivo a que estiver obrigado o incorporador, o titular do domínio e o titular dos direitos aquisitivos do imóvel, em decorrência de contratos preliminares (promessa de compra e venda, por exemplo).

E mais. Esclarece o §5º do mencionado artigo, por exemplo, que “o mandato outorgado à Comissão de Representantes confere poderes para transmitir domínio, direito, posse e ação, manifestar a responsabilidade do alienante pela evicção e imitir os adquirentes na posse das unidades respectivas”.

Esclarece o §11º do mencionado artigo que, “Caso decidam pela continuação da obra, os adquirentes ficarão automaticamente sub-rogados nos direitos, nas obrigações e nos encargos relativos à incorporação, inclusive aqueles relativos ao contrato de financiamento da obra, se houver”.

Poderá a comissão de representantes, investida de mandato legal em caráter irrevogável, receber o preço e dar quitação em nome da incorporadora, bem como promover as medidas extrajudiciais ou judiciais necessárias a esse recebimento.

Como dito, havendo saldo positivo entre as receitas da incorporação e o custo da conclusão da incorporação, o valor correspondente deverá ser entregue à massa falida pela Comissão de Representantes. Havendo saldo negativo, habilitam-se os créditos.

Em suma, os adquirentes, por meio da respectiva comissão, passam a administrar o empreendimento (claro, se não tiverem optado pela liquidação), nos termos do art. 31-F e seguintes da Lei 4.591/64.

Se a insolvência for da companhia securitizadora, nos casos de certificados de recebíveis imobiliários, o art. 15 da Lei 9.514/97 dispõe que “no caso de insolvência da companhia securitizadora, o agente fiduciário assumirá imediatamente a custódia e administração dos créditos imobiliários integrantes do patrimônio separado e convocará a assembléia geral dos beneficiários para deliberar sobre a forma de administração, observados os requisitos estabelecidos no § 2º do art. 14”(sic) .

Fábio Ulhoa Coelho, ao comentar o art. 119, IX, da Lei 11.101[16], primeiramente critica a terminologia. Em seguida, explica a função do patrimônio separado, estatuindo que nas hipóteses de insolvência este não deve ser afetado, permanecendo em vigor as condições originais. Em linha com o que vimos no começo deste estudo, o autor aborda ainda as relações do patrimônio separado da seguinte maneira: (i) o credor de passivo do patrimônio separado deve exaurir primeiramente este para, se o caso, atingir o restante do patrimônio, (ii) o titular de passivo não separado não pode atingir o ativo separado, (iii) a instituição do patrimônio separado pode definir que nem mesmo após o exaurimento do patrimônio separado os bens não separados poderão ser atingidos por credores do patrimônio de afetação e (iv) eventual saldo só se reintegra ao patrimônio principal após a liquidação do patrimônio separado[17].

Manoel Justino, atualizando a obra de Pontes de Miranda, ao tratar dos bens arrecadáveis na falência também esclarece que “os patrimônios de afetação não poderão ser arrecadados, devendo observar-se as cautelas do inc. IX do art. 119, permitindo-se apenas o saldo a favor da massa falida, se houver, após o cumprimento da finalidade para a qual houve a afetação”[18].

Nessa mesma linha, acrescenta Ricardo Tepedino que não vê “óbice a que, antes disso [arrecadação do saldo positivo], se aliene o direito a receber esse futuro e eventual saldo, se tiver valor econômico. Naturalmente, se a afetação se tiver feito com fraude ou se enquadre nas hipóteses do art. 129 da LRE, sua ineficácia deve ser decretada”[19].

Melhim segue na mesma linha, reiterando a incomunicabilidade do patrimônio afetado, mesmo nos casos de insolvência da incorporadora. Referido autor, contudo, tece críticas ao disposto no art. 9º da Lei 10.931/2004 [20], pontuando que se o caso for de assumir a obra, os adquirentes de toda forma sub-rogar-se-ão nas dívidas e obrigações. O que a Lei deveria ter feito era criar condições mais favoráveis ao pagamento dessas dívidas e não dificultar a situação.

De tudo isso, é possível concluir, então, que no cenário da falência o patrimônio afetado não é arrecadado à massa.

Uma vez decretada a quebra, os adquirentes, por meio de comitê de representantes, passam a gerir aquele empreendimento se nesse sentido deliberarem. Assim, sub-rogam-se nos respectivos direitos e deveres e recebem, da Lei, amplos poderes, até mesmo para celebrar negócios jurídicos em nome da incorporadora falida.

Havendo saldo, este sim é arrecadado à massa. Havendo aporte dos adquirentes em montante superior ao que deveriam originalmente aportar, estes se habilitarão no processo falimentar pela diferença.

  1. O PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL
    Se o cenário do patrimônio de afetação na falência parece bastante claro, o mesmo não se pode dizer na recuperação judicial.

Pelo contrário. Podemos começar afirmando que há uma lacuna legislativa neste tocante. É que patrimônio de afetação é tratado na Lei 11.101 de 2005 pelo art. 119, IX (transcrito acima), que está inserto no Capítulo V da Lei, Capítulo este que trata exclusivamente “DA FALÊNCIA”.

Não há uma palavra sequer sobre patrimônio de afetação em disposições atinentes à recuperação da empresa (extra e judicial).

Assim sendo, muitas dúvidas surgem diante da evidente omissão legislativa. A questão essencial que se coloca é se os credores do patrimônio afetado estão sujeitos aos efeitos da recuperação, bem como se a recuperanda poderá negociar esta parte de seu patrimônio na seara recuperacional.

Como já tivemos a oportunidade de analisar, uma das principais características do patrimônio de afetação é ser incomunicável. Na letra da Lei, “O patrimônio de afetação não se comunica com os demais bens, direitos e obrigações do patrimônio geral do incorporador ou de outros patrimônios de afetação por ele constituídos e só responde por dívidas e obrigações vinculadas à incorporação respectiva”[21].

Trazer os credores do patrimônio afetado para o universo da recuperação significa, necessariamente, desconsiderar a regra da incomunicabilidade.

Por outro lado, é apenas no capítulo da falência que a Lei 11.101 dispõe que patrimônio de afetação continua a ser tratado por lei especial. Poder-se-ia sustentar, então, que a lei especial não incide na parte da recuperação. Além disso, sabemos que as hipóteses de não-sujeição são taxativas e, de fato, elas não contemplam os credores de patrimônio afetado.

Contudo, vale lembrar que a ratio da criação do patrimônio de afetação é trazer segurança aos adquirentes e ao mercado, limitando o risco àquela unidade produtiva. Que garantia será essa se, em uma das hipóteses clássicas de insolvência – a RJ – ela não subsiste?

A questão foi enfrentada recentemente na recuperação judicial do Grupo Viver[22]. Na hipótese, Sheila Neder Cerezetti deu parecer no sentido de que o patrimônio afetado e seus credores se sujeitam, sim, aos efeitos da recuperação. No parecer, ao responder ao quesito “A existência de patrimônios de afetação impede a consolidação substancial da Recuperação Judicial do Grupo Viver?”, a Professora opinou em sentido negativo, frisando:

Tanto a disciplina do patrimônio de afetação quanto a lei concursal preocuparam-se em abordar os direitos das partes no cenário de falência ou insolvência civil da incorporadora, nada dispondo sobre os seus efeitos na recuperação judicial. Esta lacuna não deve ser preenchida mediante a aplicação analógica das regras falimentares, pois não se pode admitir que o intérprete empregue um regime estruturado sobre regras de liquidação patrimonial em ambiente com propósitos nitidamente distintos. Se, na falência, é a sua lógica liquidatória a justificar a previsão de uma execução independente do patrimônio de afetação quando da insolvência da incorporadora (art. 31-F da Lei 4.591/1964), o objetivo de manter a atividade produtiva, que marca a recuperação judicial, impede que a mesma norma seja a ela aplicada. Na recuperação, sacrifício aceito pelas partes interessadas justifica-se em vista do objetivo de reestruturação e continuação da atividade.[23]

Não foi esse, todavia, o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Com efeito, deferido o processamento com a consolidação substancial, a questão foi devolvida ao Tribunal por meio dos autos do agravo nº 2236772-85.2016.8.26.0000, relatoria do Des. Fábio Tabosa. E ali restou decidido que o patrimônio de afetação não se sujeita aos efeitos da recuperação judicial. In verbis:

Incompatibilidade que se acentua na hipótese de existência de patrimônio de afetação, como no caso examinado. Patrimônio segregado por lei mesmo na hipótese de falência e que exclui por igual a possibilidade de recuperação judicial, enquanto não encerrado. Proteção que se volta não apenas aos adquirentes, mas também, por expressa disposição legal, ao financiador da obra, como forma de favorecer e estimular o crédito. Impedimento que persiste, assim, mesmo se eventualmente concluída a obra, mas não liquidadas as obrigações para com o financiador. Inteligência dos arts. 119, IX, da LRF, 31- A, 31-E, 31-F e 43, VII, da Lei nº 4.591/64. Recurso provido também nessa parte, para exclusão do processo recuperacional de todas as SPEs nessa condição, referidas na decisão agravada.

Neste momento do acórdão, o relator menciona parecer de Francisco Satiro dado em outro caso envolvendo empresa também do ramo de incorporações e extrai do mencionado parecer o quanto segue:

É nesse exato sentido que há incompatibilidade lógica entre as normas da Lei 4.591/64 e a Lei 11.101/2005. Pela Lei 11.101/2005, a recuperação judicial deve possibilitar a recuperação da empresa em crise porém viável, para o que coloca devedor e credores “em lados opostos da mesa” para negociar o melhor destino da empresa e de seu patrimônio. E dá aos credores, organizados em Assembleia e decidindo por maioria, o poder de aceitar ou não a proposta de solução feita pelo devedor através do plano. No caso do empreendimento realizado por SPE em regime de patrimônio de afetação, a lei confere não aos credores, mas aos adquirentes também em assembleia e em regime de maioria a prerrogativa de destinação dos bens que estão segregados como meio de garantia do imóvel adquirido. Eles podem escolher, inclusive, por terminar o empreendimento substituindo o incorporador.

Em seguida, o acórdão cita artigo de Marcelo Sacramone[24]no qual este defende que indene de dúvida que o patrimônio de afetação na incorporação imobiliária é incompatível com o regime da recuperação judicial e a ela não se sujeita, indo além, dizendo que mesmo nos casos de segregação patrimonial via SPE’s essa incompatibilidade verificar-se-ia, ante a função econômica-social, para a economia popular, das incorporações imobiliárias.

Conforme tivemos a oportunidade de apreciar anteriormente, a sociedade de propósito específico é pessoa jurídica autônoma. Assim, conforme se extrai do voto do Relator e da doutrina especializada nele mencionada, faz-se indispensável a análise caso a caso para saber se aquela sociedade deve ou não integrar o polo ativo da recuperação judicial. Não faz sentido que, estando saudável e não preenchendo os requisitos legais, apenas por fazer parte de grupo econômico, torne-se recuperanda.

Além disso, como vimos acima, também no caso das SPEs existe um forte argumento de economia popular que talvez, mesmo não estando o patrimônio afetado, impeça-as de entrarem em recuperação.

O acórdão prossegue enfrentando a controvérsia principal, em outras palavras, se o fato de o tratamento ao patrimônio de afetação na Lei 11.101/05 ter sido dado em capítulo exclusivo da falência faz com que referido artigo não se aplique às recuperações judiciais. Conclui o acórdão:

Mas, pensando na possibilidade em si do pleito recuperacional, do ponto de vista sistemático não se justifica que, se no caso de falência, que é o mais, não apenas o patrimônio seja preservado como também preservadas em sua essência as relações obrigacionais envolvendo o incorporador, como se quebra não existisse, venham em contrapartida na recuperação judicial, que é o menos, a se sujeitar os credores relativos a patrimônios de afetação à modificação de seus direitos, com alteração de sua substância ou da forma de satisfação.

Além disso, operada no âmbito da recuperação eventual novação dos créditos, caso decretada a quebra após o biênio não haveria a reversão às condições originais de que cuida o art. 61, § 2º, da Lei nº 11.101/2005 (cf. art. 62 da mesma lei).

Assim, ainda que sob o ponto de vista da estrita compatibilidade entre a recuperação e as regras do patrimônio de afetação, pode-se responder pela negativa. Mas de todo modo, quando se retorna à perspectiva das prerrogativas em especial conferidas aos adquirentes, sobretudo pela previsão do art. 43, VII, da Lei nº 4.591/64, a conclusão fica definitivamente assentada.

E para sustentar sua posição, o acórdão cita a doutrina de Alexandre Guerra, Melhim Namem Chalhub e Marcelo Barbosa Sacramone.

Interessante notar que na análise comparativa entre processos que envolvem a insolvência (recuperação judicial e falência), o Tribunal se utiliza do princípio argumentativo a maiori, ad minus, ou seja, se o patrimônio de afetação não pode sofrer os efeitos da falência tampouco poderia sofrer os efeitos da recuperação judicial cujo escopo não é de liquidação.

Outro caso importante para o tema patrimônio de afetação é o do Grupo PDG[25]. Com efeito, a PDG era uma das maiores construtoras e incorporadoras do País. Sobrevindo a crise, apresentou pedido de recuperação judicial com todas as SPEs e patrimônios afetados.

Sob a condução do Dr. João Oliveira Rodrigues Filho e com a contribuição dos demais players, especialmente os bancos, já no primeiro grau de jurisdição o que era patrimônio de afetação da PDG foi excluído da RJ. As SPEs, no entanto, continuaram sujeitas[26].

Mais um precedente interessante do TJSP sobre o tema é de relatoria do Des. Hamid Bdine no caso JNK EMPREENDIMENTOS ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES LTDA[27]. Confira-se a ementa:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. INCORPORADORA IMOBILIÁRIA. PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO. PRELIMINAR. INTEMPESTIVIDADE. Rejeição. Agravo interposto contra a decisão no prazo legal. MÉRITO. Decisão agravada que determina que o banco se abstenha de interferir nas contas vinculadas a patrimônio separado. Alegação do agravante de que seu crédito decorre da celebração do contrato de empréstimo destinado a viabilizar a incorporação imobiliária de determinados empreendimentos e que por isso pode utilizar os recebíveis para pagar o saldo devedor envolvendo o mútuo. Patrimônio separado. Incomunicabilidade com os demais direitos e obrigações de titularidade da recuperanda. Recuperação judicial que não interfere no patrimônio vinculado ao empreendimento imobiliário. Empresa incorporadora que é responsável pela gestão dos recursos e pela aplicação para se atingir o fim específico de sua criação. Crédito do agravante que se vincula ao patrimônio afetado. Pagamento realizado a partir dos recebíveis que deve observar a correlação entre o empréstimo concedido à recuperanda e o valor pago pelos adquirentes pela unidade imobiliária com o objetivo de saldar a dívida da construtora. Reconhecimento de que o emprego desses recursos pelo banco sem nenhuma correspondência com o empreendimento que deu origem à conta é ilícito pode submeter-se a controle oportuno. Para se preservar a edificação dos imóveis e atender à finalidade do patrimônio de afetação, a amortização deve ser de dívidas vencidas. Negada a amortização de dívida vencida antecipadamente pela apresentação de pedido de recuperação. Recurso provido em parte.

E, ainda, neste mesmo sentido:

Agravo de instrumento. Recuperação judicial. Decisão que deferiu o processamento conjunto da recuperação das agravadas e determinou a apresentação de plano individualizado pelas sociedades de propósito específico com patrimônio de afetação. Recurso conhecido, a despeito do equívoco na identificação dos patronos das agravadas, não havido efetivo prejuízo à sua defesa. Fixado o entendimento, nesta 2ª Câmara, de que incompatível o instituto da recuperação judicial com o patrimônio de afetação. Extinção da afetação, ademais, que não se dá tão somente pelo término e averbação da obra, instituído o condomínio, senão também pela satisfação das obrigações garantidas, incluído o crédito do financiador, e cancelamento do registro respectivo. Artigo 31-E, inciso I, da Lei 4.591/64, com redação dada pela Lei 10.931/04. Decisão revista. Recurso provido” (AI 2052507-11.2017.8.26.0000, rel. Des. Claudio Godoy, íntegra no site.

Nesta linha de raciocínio e mantendo a coerência de uma jurisprudência una, o Tribunal Bandeirante já decidiu, inclusive, que se aquela dívida específica disser respeito ao patrimônio de afetação, ela pode ser executada a despeito do processamento da recuperação judicial da incorporadora. In verbis:

Agravo de instrumento. Indenização por danos materiais e morais. Compra e venda de unidade imobiliária. Cumprimento de sentença. Penhora de imóvel da incorporadora. Pedido de suspensão da execução pela executada, em razão da decretação de sua recuperação judicial. Decisão que deferiu o pedido. Recurso dos exequentes. Alegação de que o imóvel integra patrimônio de afetação, o qual não estaria sujeito aos efeitos da recuperação judicial. Cabimento. Os efeitos da decretação de falência ou da insolvência civil da incorporadora não atingem o patrimônio de afetação constituído, não integrando a massa concursal Inteligência do art. 31-F da Lei n.º 4.591/64, com a redação que lhe deu a Lei n.º 10.931/2004. Execução que deve continuar. Decisão reformada. AGRAVO PROVIDO”. (AI 2053576-78.2017.8.26.0000, rel. Des. Miguel Brandi, íntegra no site)

Assim sendo, fortalecendo a natureza dos institutos de Direito aqui abordados, doutrina e jurisprudência[28] vão firmando posição no sentido de que o patrimônio de afetação não está sujeito aos efeitos da recuperação judicial, assim como não está aos da falência.

CONCLUSÃO
O patrimônio de afetação é um importante instrumento de defesa de todos os envolvidos na incorporação imobiliária, devendo ser, desta forma, prestigiado e defendido.

Quando da falência da incorporadora, o comitê de representantes deve convocar assembleia que decidirá sobre a liquidação ou não do empreendimento afetado. Se a decisão for pelo prosseguimento, os adquirentes se sub-rogam nos direitos e obrigações, passando a ser dotados de importantes poderes. Ao final, havendo saldo credor, será este arrecadado à massa. Havendo saldo devedor, os adquirentes deverão se habilitar no concurso de credores.

No que tange ao patrimônio de afetação na recuperação judicial, seria altamente desejável que o Poder Legislativo suprisse a lacuna existente e regulamentasse a situação.

Enquanto a lacuna legislativa não é preenchida, doutrina e jurisprudência vão tratando do tema à luz dos princípios que norteiam a matéria e, ao que parece, a posição dominante é no sentido de que o patrimônio afetado e seus credores não se sujeitam à recuperação judicial do respectivo titular.

REFERÊNCIAS
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BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de recuperação de empresas e falência: Lei 11.101/2005: comentada artigo por artigo. 13ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.

Chalhub, Melhim Namem. Da incorporação imobiliária. 3ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2010.

Coelho, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Volume 3.: direito de empresa. 20ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016;

___. Comentários à Lei de Falência e de Recuperação de Empresa. 12ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017;

MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Tomo V. Eficácia Jurídica. Direitos. Ações. Atualizado por Marcos Bernardes de Mello e Marcos Ehrhardt Jr. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.

____. Tratado de direito privado. Tomo XII. Direito das coisas. Condomínio. Terras devolutas. Atualizado por Jefferson Carús Guedes e Otavio Luiz Rodrigues Junior. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.

__________. Tratado de direito privado. Tomo XXIX. Direito das obrigações. Administração da Falência. Atualizado por Manoel Justino Bezerra Filho. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.

NEGRÃO, THEOTONIO e outros. Código Civil e legislação civil em vigor. Ed. Saraiva, 35ª ed., 2017.

NERY, Nelson e Rosa. Código Civil Comentado e legislação extravagante, 3ª ed., Ed. RT.

Rodrigues, Silvio. Direito Civil. Parte Geral. Vol. 1, 30ª ed. São Paulo, Editora Saraiva.

Toledo, Paulo F.C. Salles e Abrão, Carlos Henrique. Coord. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. 2ª ed. São Paulo: Ed. Saraiva.

SACRAMONE, MARCELO, in Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, vol. 76.

NOTAS
[1] Miranda, Pontes de. Tratado de direito privado. Tomo V. Eficácia Jurídica. Determinações inexas e anexas. Direitos. Pretensões. Ações. Atualizado por Marcos Bernardes de Mello e Marcos Ehrhardt Jr. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, pag. 443.

[2] Rodrigues, Silvio. Direito Civil. Parte Geral. Vol. 1, 30ª ed. São Paulo, Editora Saraiva. Pag. 111.

[3] Chalhub, Melhim Namem. Da incorporação imobiliária. 3ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2010. Pag. 82

[4] Miranda, Pontes de. Ob. Cit. Tomo XII, pag. 331.

[5] As demais somente podem ser praticadas por pessoas não sujeitas a falência e RJ.

[6] Incorporação Imobiliária. Revista de Direito Imobiliário. Vol. 4. P. 9. São Paulo: Ed. RT, jul. 1979

[7] Idem, pag. 330

[8] Conforme art. 981 do Código Civil Brasileiro.

[9] Por todas, vide Melhim, ob. cit.

[10] Exemplificativamente, vide precedente do TRF4, mencionado por Pontes de Miranda (ob. cit. Tomo V, pag. 466), em que se determina a expedição de certidão negativa de débito à incorporação afetada, a despeito de a incorporadora ser devedora de tributos.

[11] Com a obtenção do habite-se, a quitação das obrigações do incorporador com as entidades financiadoras e a transferência de domínio aos adquirentes.

[12] Art. 31-A. A critério do incorporador, a incorporação poderá ser submetida ao regime da afetação, pelo qual o terreno e as acessões objeto de incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do incorporador e constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da incorporação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes.

§ 1o O patrimônio de afetação não se comunica com os demais bens, direitos e obrigações do patrimônio geral do incorporador ou de outros patrimônios de afetação por ele constituídos e só responde por dívidas e obrigações vinculadas à incorporação respectiva.

§ 2o O incorporador responde pelos prejuízos que causar ao patrimônio de afetação.

§ 3o Os bens e direitos integrantes do patrimônio de afetação somente poderão ser objeto de garantia real em operação de crédito cujo produto seja integralmente destinado à consecução da edificação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes.

§ 4o No caso de cessão, plena ou fiduciária, de direitos creditórios oriundos da comercialização das unidades imobiliárias componentes da incorporação, o produto da cessão também passará a integrar o patrimônio de afetação, observado o disposto no § 6o.

§ 5o As quotas de construção correspondentes a acessões vinculadas a frações ideais serão pagas pelo incorporador até que a responsabilidade pela sua construção tenha sido assumida por terceiros, nos termos da parte final do § 6o do art. 35.

§ 6o Os recursos financeiros integrantes do patrimônio de afetação serão utilizados para pagamento ou reembolso das despesas inerentes à incorporação.

§ 7o O reembolso do preço de aquisição do terreno somente poderá ser feito quando da alienação das unidades autônomas, na proporção das respectivas frações ideais, considerando-se tão-somente os valores efetivamente recebidos pela alienação.

§ 8o Excluem-se do patrimônio de afetação:

I – os recursos financeiros que excederem a importância necessária à conclusão da obra (art. 44), considerando-se os valores a receber até sua conclusão e, bem assim, os recursos necessários à quitação de financiamento para a construção, se houver; e

II – o valor referente ao preço de alienação da fração ideal de terreno de cada unidade vendida, no caso de incorporação em que a construção seja contratada sob o regime por empreitada (art. 55) ou por administração (art. 58).

§ 9o No caso de conjuntos de edificações de que trata o art. 8o, poderão ser constituídos patrimônios de afetação separados, tantos quantos forem os:

I – subconjuntos de casas para as quais esteja prevista a mesma data de conclusão (art. 8o, alínea “a”); e

II – edifícios de dois ou mais pavimentos (art. 8o , alínea “b”).

§ 10. A constituição de patrimônios de afetação separados de que trata o § 9o deverá estar declarada no memorial de incorporação.

§ 11. Nas incorporações objeto de financiamento, a comercialização das unidades deverá contar com a anuência da instituição financiadora ou deverá ser a ela cientificada, conforme vier a ser estabelecido no contrato de financiamento.

§ 12. A contratação de financiamento e constituição de garantias, inclusive mediante transmissão, para o credor, da propriedade fiduciária sobre as unidades imobiliárias integrantes da incorporação, bem como a cessão, plena ou fiduciária, de direitos creditórios decorrentes da comercialização dessas unidades, não implicam a transferência para o credor de nenhuma das obrigações ou responsabilidades do cedente, do incorporador ou do construtor, permanecendo estes como únicos responsáveis pelas obrigações e pelos deveres que lhes são imputáveis.

Art. 31-B. Considera-se constituído o patrimônio de afetação mediante averbação, a qualquer tempo, no Registro de Imóveis, de termo firmado pelo incorporador e, quando for o caso, também pelos titulares de direitos reais de aquisição sobre o terreno

Art. 31-E. O patrimônio de afetação extinguir-se-á pela:

I – averbação da construção, registro dos títulos de domínio ou de direito de aquisição em nome dos respectivos adquirentes e, quando for o caso, extinção das obrigações do incorporador perante a instituição financiadora do empreendimento; II – revogação em razão de denúncia da incorporação, depois de restituídas aos adquirentes as quantias por eles pagas (art. 36), ou de outras hipóteses previstas em lei; e

III – liquidação deliberada pela assembléia geral nos termos do art. 31-F, § 1o.

[13] Em sentido contrário, confira-se acórdão proferido no AI 2223172-60.2017.8.26.0000 pelo TJSP.

[14] Ob. cit., pag. 73

[15] Art. 31-F. Os efeitos da decretação da falência ou da insolvência civil do incorporador não atingem os patrimônios de afetação constituídos, não integrando a massa concursal o terreno, as acessões e demais bens, direitos creditórios, obrigações e encargos objeto da incorporação.

§ 1o Nos sessenta dias que se seguirem à decretação da falência ou da insolvência civil do incorporador, o condomínio dos adquirentes, por convocação da sua Comissão de Representantes ou, na sua falta, de um sexto dos titulares de frações ideais, ou, ainda, por determinação do juiz prolator da decisão, realizará assembléia geral, na qual, por maioria simples, ratificará o mandato da Comissão de Representantes ou elegerá novos membros, e, em primeira convocação, por dois terços dos votos dos adquirentes ou, em segunda convocação, pela maioria absoluta desses votos, instituirá o condomínio da construção, por instrumento público ou particular, e deliberará sobre os termos da continuação da obra ou da liquidação do patrimônio de afetação (art. 43, inciso III); havendo financiamento para construção, a convocação poderá ser feita pela instituição financiadora.

§ 2o O disposto no § 1o aplica-se também à hipótese de paralisação das obras prevista no art. 43, inciso VI.

§ 3o Na hipótese de que tratam os §§ 1o e 2o, a Comissão de Representantes ficará investida de mandato irrevogável para firmar com os adquirentes das unidades autônomas o contrato definitivo a que estiverem obrigados o incorporador, o titular do domínio e o titular dos direitos aquisitivos do imóvel objeto da incorporação em decorrência de contratos preliminares.

§ 4o O mandato a que se refere o § 3o será válido mesmo depois de concluída a obra.

§ 5o O mandato outorgado à Comissão de Representantes confere poderes para transmitir domínio, direito, posse e ação, manifestar a responsabilidade do alienante pela evicção e imitir os adquirentes na posse das unidades respectivas.

§ 6o Os contratos definitivos serão celebrados mesmo com os adquirentes que tenham obrigações a cumprir perante o incorporador ou a instituição financiadora, desde que comprovadamente adimplentes, situação em que a outorga do contrato fica condicionada à constituição de garantia real sobre o imóvel, para assegurar o pagamento do débito remanescente.

§ 7o Ainda na hipótese dos §§ 1o e 2o, a Comissão de Representantes ficará investida de mandato irrevogável para, em nome dos adquirentes, e em cumprimento da decisão da assembléia geral que deliberar pela liquidação do patrimônio de afetação, efetivar a alienação do terreno e das acessões, transmitindo posse, direito, domínio e ação, manifestar a responsabilidade pela evicção, imitir os futuros adquirentes na posse do terreno e das acessões.

§ 8o Na hipótese do § 7o, será firmado o respectivo contrato de venda, promessa de venda ou outra modalidade de contrato compatível com os direitos objeto da transmissão.

§ 9o A Comissão de Representantes cumprirá o mandato nos termos e nos limites estabelecidos pela deliberação da assembléia geral e prestará contas aos adquirentes, entregando-lhes o produto líquido da alienação, no prazo de cinco dias da data em que tiver recebido o preço ou cada parcela do preço.

§ 10. Os valores pertencentes aos adquirentes não localizados deverão ser depositados em Juízo pela Comissão de Representantes.

§ 11. Caso decidam pela continuação da obra, os adquirentes ficarão automaticamente sub-rogados nos direitos, nas obrigações e nos encargos relativos à incorporação, inclusive aqueles relativos ao contrato de financiamento da obra, se houver.

§ 12. Para os efeitos do § 11 deste artigo, cada adquirente responderá individualmente pelo saldo porventura existente entre as receitas do empreendimento e o custo da conclusão da incorporação na proporção dos coeficientes de construção atribuíveis às respectivas unidades, se outro critério de rateio não for deliberado em assembléia geral por dois terços dos votos dos adquirentes, observado o seguinte:

I – os saldos dos preços das frações ideais e acessões integrantes da incorporação que não tenham sido pagos ao incorporador até a data da decretação da falência ou da insolvência civil passarão a ser pagos à Comissão de Representantes, permanecendo o somatório desses recursos submetido à afetação, nos termos do art. 31-A, até o limite necessário à conclusão da incorporação;

II – para cumprimento do seu encargo de administradora da incorporação, a Comissão de Representantes fica investida de mandato legal, em caráter irrevogável, para, em nome do incorporador ou do condomínio de construção, conforme o caso, receber as parcelas do saldo do preço e dar quitação, bem como promover as medidas extrajudiciais ou judiciais necessárias a esse recebimento, praticando todos os atos relativos ao leilão de que trata o art. 63 ou os atos relativos à consolidação da propriedade e ao leilão de que tratam os arts. 26 e 27 da Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, devendo realizar a garantia e aplicar na incorporação todo o produto do recebimento do saldo do preço e do leilão;

III – consideram-se receitas do empreendimento os valores das parcelas a receber, vincendas e vencidas e ainda não pagas, de cada adquirente, correspondentes ao preço de aquisição das respectivas unidades ou do preço de custeio de construção, bem como os recursos disponíveis afetados; e

IV – compreendem-se no custo de conclusão da incorporação todo o custeio da construção do edifício e a averbação da construção das edificações para efeito de individualização e discriminação das unidades, nos termos do art. 44.

§ 13. Havendo saldo positivo entre as receitas da incorporação e o custo da conclusão da incorporação, o valor correspondente a esse saldo deverá ser entregue à massa falida pela Comissão de Representantes.

(omissis)

[16] Coelho, Fábio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. 12ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017.

[17] Ob. cit., pag 119.

[18] Ob. Cit. XXIX, pag. 119

[19] Toledo, Paulo F.C. Salles e Abrão, Carlos Henrique. Coord. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. 2ª ed. São Paulo: Ed. Saraiva, pag 120.

[20] “Art. 9o Perde eficácia a deliberação pela continuação da obra a que se refere o §1º do art. 31-F da Lei nº 4.591, de 1964, bem como os efeitos do regime de afetação instituídos por esta Lei, caso não se verifique o pagamento das obrigações tributárias, previdenciárias e trabalhistas, vinculadas ao respectivo patrimônio de afetação, cujos fatos geradores tenham ocorrido até a data da decretação da falência, ou insolvência do incorporador, as quais deverão ser pagas pelos adquirentes em até um ano daquela deliberação, ou até a data da concessão do habite-se, se esta ocorrer em prazo inferior”.

[21] §1º do art. 31-A da Lei 4.591/64.

[22] Processo nº 1103236-83.2016.8.26.0100.

O Grupo Viver é composto por sociedades dedicadas à exploração de negócios imobiliários. Diante do cenário de crise, o grupo pediu recuperação judicial e requereu a chamada consolidação substancial, pretendendo a apresentação de um só plano, incluindo nele os patrimônios afetados.

[23]Íntegra da resposta ao quesito:

“Não. O patrimônio de afetação é instrumento criado com vistas a garantir que a conclusão de um empreendimento se faça mediante o uso dos recursos a ele destinados, ou seja, sem que estes sejam versados em benefício de outra obra.

Tanto a disciplina do patrimônio de afetação quanto a lei concursal preocuparam-se em abordar os direitos das partes no cenário de falência ou insolvência civil da incorporadora, nada dispondo sobre os seus efeitos na recuperação judicial. Esta lacuna não deve ser preenchida mediante a aplicação analógica das regras falimentares, pois não se pode admitir que o intérprete empregue um regime estruturado sobre regras de liquidação patrimonial em ambiente com propósitos nitidamente distintos. Se, na falência, é a sua lógica liquidatória a justificar a previsão de uma execução independente do patrimônio de afetação quando da insolvência da incorporadora (art. 31-F da Lei 4.591/1964), o objetivo de manter a atividade produtiva, que marca a recuperação judicial, impede que a mesma norma seja a ela aplicada. Na recuperação, sacrifício aceito pelas partes interessadas justifica-se em vista do objetivo de reestruturação e continuação da atividade. No caso, isso significa manter a atividade exercida pelo Grupo Viver como um todo, pois, como visto, não há como se destacar a autonomia de cada uma das sociedades que o compõem. Sendo assim, não se pode imaginar que os interesses de determinados credores possam se sobrepor, por uma lógica liquidatória, àqueles envolvidos por toda a empresa plurissocietária, em especial ao se constatar que a unidade patrimonial que marca a gestão das atividades do Grupo Viver acarreta valorização de patrimônios das SPEs à custa de endividamento das holdings. Além disso, percebe-se que, no caso, tanto a forma de organização da atividade empresarial quanto o comportamento dos próprios credores não observavam a segregação patrimonial propugnada.

Ainda assim, a proteção aos adquirentes, objetivo máximo da regulação do patrimônio de afetação, não restou prejudicada, na medida em que os esforços caminham para a conclusão dos únicos cinco empreendimentos pendentes. Em vista do exposto, muito embora se reconheça ser impositivo o respeito aos direitos de adquirentes, não se pode afirmar que, no caso concreto, o regime do patrimônio de afetação deva ser estritamente observado na recuperação do Grupo Viver, sob pena de se favorecer indevidamente credores de sociedades operacionais em prejuízo de todos os demais que contribuíram para o desempenho da atividade grupal”

[24] in Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, pp. 21/22, vol. 76, abr-jun 2017.

[25] Processo nº 1016422-34.2017.8.26.0100

[26] Entre outras passagens:

“A sociedade de propósito específico, embora prevista nas leis 8.666/93, 11.079/04 e Lei Complementar 123/06, modificada pela Lei Complementar 128/08, é desprovida de tratamento legal e doutrinário que lhe confira estudo mais robusto, em uma perspectiva do instituto em si mesmo, porquanto a legislação existente apenas menciona ser ela um instrumento para as operações e situações específicas de cada caso, carecendo de uma perscrutação maior acerca do âmbito de abrangência de tal modalidade societária. Nessa toada, há um determinado consenso, ainda incipiente, no sentido das SPEs possuírem um objeto específico e limitado para o seu campo de atuação, o que compreenderia, também, uma limitação temporal de sua existência. Em razão de tais ideias, o peticionário, ancorado em precedente do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo e em pareceres e artigos jurídicos, sustenta a impossibilidade de uma SPE requerer sua recuperação judicial, posto a sua essência ser incompatível com a principiologia insculpida no art. 47, a qual pressupõe manutenção da atividade empresarial pelo tempo, com vistas ao atingimento dos escopos lá descritos.Com as devidas vênias, a Lei 11.101/2005 não exigiu como requisito para legitimidade ativa ao pedido de recuperação judicial a perenidade da atividade mas, tão somente, a condição de empresário do postulante, não cabendo, em matéria de hermenêutica jurídica, restringir o âmbito da autonomia privada, sem a imposição de interesse público relevante positivado no ordenamento que não há na espécie. De mais a mais, muito embora seja comum visualizarmos a figura do empresário na recuperação judicial, é certo que o art. 47 também, senão até em maior medida, abarca o perfil funcional de empresa, dentro dos perfis poliédricos desenvolvidos por Alberto Asquini, posto se buscar o soerguimento da atividade empresarial levada a Juízo, com a possibilidade, até mesmo, de afastamento do empresário condutor do empreendimento, nos termos do art. 50, IV, da Lei 11.101/2005.Outrossim, difícil não enquadrar qualquer modelo societário como um instrumental destinado à realização de um determinado empreendimento, com característica de proporcionar aos seus participantes a minoração dos riscos envolvidos na atividade, o que é corroborado pelo próprio dogma da autonomia da personalidade jurídica da pessoa jurídica. Logo, o escopo de constituição de uma SPE em nada difere do escopo da constituição de outro modelo societário previsto em nosso ordenamento. Diferentemente do quanto sustentado pelo peticionário, a constituição de uma SPE possui os objetivos de realização de uma atividade empresarial, com a criação de postos de trabalho, a instituição de uma fonte de arrecadação de tributos (v. art. 56 da LC 123/06 e Decreto 6.451/08), a consecução de empreendimento voltado à produção e circulação de bens e serviços, tudo nos moldes do art. 47 da Lei 11.101/2005.E ainda que o objeto das SPEs autoras seja a realização de empreendimento imobiliário certo e determinado, tal fato não é excludente de necessidade de soerguimento da atividade para reestruturação dos débitos da operação, diante do notório quadro de crise econômica que assola o país.Nesse caso, a recuperação judicial, como um direito posto ao empresário, funcionará como garantia, ou, ao menos, mais uma tentativa, para evitar o perecimento da atividade e a consolidação do pior quadro possível que seria a impossibilidade de término do empreendimento imobiliário, com a frustação da expectativa dos adquirentes em relação à entrega das unidades. Mais salutar a aplicação do brocardo odiosa restringenda, favorabilia amplianda. Contudo, sem prejuízo, aguarde-se a publicação da lista de credores prevista no art. 7º, §2º, da Lei 11.101/2005, para posterior verificação da necessidade de de deliberação sobre o pleito.12. Fls. 116.585/116.586. Anote o administrador judicial a reserva de valor determinada, sem prejuízo do que restar deliberado no plano de recuperação judicial a ser deliberado pelos credores em AGC.13. Fls. 117.093/117.115. Ciência aos interessados.14. Fls. 118.227/118.228. Este Juízo já se pronunciou por diversas vezes acerca da não sujeição a este processo de recuperação judicial de empreendimentos com patrimônio de afetação administrados pela recuperanda, os quais foram excluídos do feito no plano de recuperação judicial por ela apresentado após intensas negociações com os bancos credores.

[27] AI 2092288-40.2017.8.26.0000. A JNK é empresa dedicada a negócios imobiliários essencialmente residenciais.

[28] O STJ até o momento não decidiu sobre o tema.

Fonte: Jus.com.br

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